Esta semana dei por mim a ouvir um comentário de um famíliar próximo sobre o meu filho, o que me recordou alguns comentários que eu ouvia quando era mais nova, da idade dele (6 anos).

A verdade é que se pensarmos sobre a importância e a força da nossa linguagem (adultos) na construção da imagem pessoal de uma criança, talvez nos possamos surpreender. Quem nunca ouviu dizer que se dissermos algo muitas vezes e com convicção, a nossa mente acredita? Em tom de brincadeira, mas não retirando o impacto das palavras e das mensagens que, seja forma inconsciente ou subliminar, a verdade é que vamos acreditando.

Muitas vezes estes rótulos mantêm-se na nossa mente até à idade adulta. Como coach, em contexto de desenvolvimento, é comum percebermos que algumas experiências passadas na infância são revisitadas em idade adulta e que, por vezes, torna-se difícil descolarmos dessa imagem pré definida de nós, seja ela boa ou má.

Estas crenças podem enraízar-se na forma como tratamos, falamos e lidamos com os nossos filhos. Sabemos que muitas vezes nem sequer é consciente, mas se fizermos um exercício de auto conhecimento e análise, temos sempre margem para melhorar.

Podemos estar naturalmente a referir-nos a características menos positivas acerca das crianças, como ser impaciente, ser distraído, ser mau ou egoísta. E a verdade é que é muito comum ouvirmos comentários que caracterízam a criança e não o contexto/situação concreta:

És muito distraído!” em vez de “Na actividade de pintar senti que estavas a pensar noutra coisa, não estavas?”

Pequenas alterações na forma como comunicamos podem ter impactos incríveis na forma como ajudamos a construir os seres de amanhã. Da mesma forma como rótulos negativos têm impacto na definição do “eu”, também rótulos positivos, podem ter igualmente influência presente e futura. Em tempos a Joana Rebelo falou-nos sobre este tema do Elogio, o falso amigo aqui.

A verdade é que se pensarmos numa perspectiva de controlo interno ou externo, crianças que tendem a ser muito elogiadas tendem a ter pouco controlo interno e ficarem dependentes de uma avaliação externa da sua performance. Se pensarmos que cresceram habituadas a ouvir que são muito inteligentes, muito bonitas ou muito boas num determinado desporto, irão criar a sua percepção do sucesso: com pouco esforço e com grande dependência externa.

Exemplos disso é “Tu és muito inteligente” ou “que lindo o teu desenho!” em vez de “nota-se que te esforçaste muito para desenhares esse urso, queres-me contar o que são estes pontos?”

Quando falamos em linguagem, gostávamos também de falar em linguagem encorajadora e realista, aquela que se foca nos pontos positivos sem dar demasiado relevo à negatividade no discurso, fazendo constantemente um exercício de relativizar e de focar no que é mais importante.

Tive um bom exemplo disso esta semana: o meu filho não queria ir ao futebol, uma actividade que até agora sempre o deixou muito feliz e estava sempre predisposto para ir. Esta semana disse que não queria, que nunca marca golos, que os meninos fazem muitas faltas e que o magoam. Há dias menos bons, todos nós sabemos e todos nós também os temos. No entanto, na minha opinião, o nosso papel enquanto pais é relativizar este sentimento, não dando demasiada importância, nem mostrando que assim se resolvem as nossas questões pessoais: não enfrentar o que nos incomoda. Em vez disso, fi-lo recordar as vezes anteriores em que ele saiu do treino a cantar ” Campeões, Campeões, Nós somos Campeões” e o sentimento de partilha e de entreajuda entre todos os elementos da equipa e como aqueles momentos foram importante para ele, perguntando se eles gostava de voltar a fazer parte da equipa.

Nestes primeiros anos de vida, estes pormenores podem ajudar a que a criança tenha uma maior predisposição para lidar com o fracasso e com o insucesso. Podemos apoiar o desenvolvimento de persistência de forma mais eficaz se trabalharmos a forma como respondemos por exemplo, sempre que algo acontece e em que as crianças procuram a nossa validação/conforto. Quando uma criança cai, a maioria das vezes ouvimos os familiares reagirem: “Oh, caíste! Magoaste-te? Doeu muito, foi?”. Em vez disso, podemos reformular a forma como reagimos a esse acontecimento e reforçar a sua capacidade de superação: “Esforçaste-te muito na corrida até aqui! Vá, continua, tu consegues!”

Basta pensar nas imensas capacidades que eles adquirem nestes primeiros anos, desde caminhar até à capacidade de ler. Todas estas novas capacidades são oportunidades para errar, experienciar estes sentimentos e de aprender superá-los através da persistência para se se tornem adultos mais capazes.

Boa semana!

Rosana Fernandes

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